Carros híbridos flex podem acrescentar R$ 877 bilhões ao PIB e gerar 1 milhão de empregos
Conclusão é de estudo que leva em conta as vantagens do Brasil com o uso de biocombustíveis em relação ao investimento em veículos 100% elétricos
César Tizo - abril 23, 2024
Um interessante estudo divulgado pelo Acordo de Cooperação Mobilidade de Baixo Carbono para o Brasil (MBCB) nos permite enxergar de forma clara as vantagens que cada país obtém ao priorizar suas vantagens competitivas na busca por uma transição energética limpa, economicamente viável e socialmente responsável.
O MBCB é um esforço conjunto que reúne 25 entidades entre fabricantes, empresas do setor sucroenergético e de biogás, além de indústrias de autopeças, pós-venda, associações de tecnologia e engenharia bem como sindicatos de trabalhadores.
Entre essas empresas encontram-se a Toyota do Brasil, Volkswagen do Brasil, Tupy, SAE Brasil, AEA, Bosch, a chinesa BYD, entre outras companhias.
Para aprofundar as discussões em torno do tema, o MBCB encomendou um estudo inédito da LCA Consultores e MTempo Capital intitulado “Trajetórias Tecnológicas mais Eficientes para a Descarbonização da Mobilidade“, que aponta o potencial do Brasil em se tornar protagonista na transição para um setor de transporte com menor emissão de carbono, incentivando o uso de soluções limpas disponíveis e considerando tecnologias renováveis emergentes, ao mesmo tempo em que deixa claro o impacto socioeconômico da transição energética.
Rotas tecnológicas
O levantamento partiu de três diferentes cenários para a eletrificação da frota veicular brasileira: o status quo (cenário de controle), onde não há mudanças estruturais na configuração atual dos carros, e outros dois cenários em que há uma convergência para o padrão global de eletrificação: um com ênfase nos veículos híbridos (HEV) e outro cenário com a prevalência dos veículos elétricos puros (BEV).
A partir dessas premissas, foram estabelecidas hipóteses que permitiram projetar a composição da frota nos anos de referência e fornecer uma base para se compreender os possíveis caminhos de eletrificação da frota e seus resultados em termos das emissões de gases de efeito estufa (GEE) e dos impactos associados na indústria, economia, geração de empregos e renda.
Sendo assim, a comparação da evolução do cenário automotivo até 2050 revelou descobertas surpreendentes.
Analisando a convergência global em direção aos veículos híbridos e elétricos, os resultados mostram que os veículos híbridos emergem como líderes em termos de impacto econômico positivo.
Os cenários indicam que os veículos híbridos não apenas superam os elétricos em termos de produção, Produto Interno Bruto (PIB), empregos e impostos gerados, prevendo um aumento significativo de 1.062.947 trabalhadores no setor de transporte e projeção de aumento no PIB da ordem de R$ 877 bilhões em relação ao cenário de controle (status quo).
“Os resultados do estudo indicam que o cenário com predominância de veículos híbridos, além de propiciar redução expressiva das emissões de gases de efeito estufa, tende a impulsionar a economia brasileira e promover a criação de empregos de forma mais dinâmica, em comparação com os demais cenários, pois se preservam os elos da cadeia produtiva e se acrescentam novas tecnologias“, analisa o professor Luciano Coutinho, sócio da MTempo Capital.
As análises apontam que, se prevalecerem os veículos 100% elétricos, é possível que haja perdas consideráveis para a economia brasileira, visto que estes veículos demandam um volume menor de partes e peças a serem produzidas.
Por outro lado, esses carros irão depender da importação de componentes estratégicos para as baterias (células à base de lítio e outros minerais), cuja produção está fortemente concentrada em poucos países, em plantas industriais de elevada escala produtiva e fortemente apoiadas pelos respectivos governos locais.
“Não há sinais claros de que o Brasil possa ser receptor de investimentos para a produção local de células de bateria, o ‘coração’ dos veículos elétricos e componente de maior valor adicionado; a falta de escala e ausência de incentivos, relativamente ao que existe em diversos países desenvolvidos, são fatores que afastam do país estes investimentos a curto e médio prazos. A dificuldade em definir qual rota tecnológica se mostrará mais competitiva para as baterias, em momento de grandes inovações disruptivas, também atrapalha decisões de investimento fora dos grandes centros globais de pesquisa, desenvolvimento e inovação”, ressalta Fernando Camargo, sócio-diretor da LCA Consultores.
Uma análise comparativa das emissões de veículos leves e pesados revela diferenças significativas.
Enquanto os leves, que respondem por cerca de 94% da frota nacional, já incorporam tecnologias de baixo carbono, como o uso de etanol, a descarbonização dos veículos pesados torna-se urgente. Com cerca de 6% da frota, os pesados são responsáveis por cerca de 57% das emissões de gases de efeito estufa (GEE).
Neste sentido, é necessário incentivar e acelerar a introdução de tecnologias alternativas – como veículos elétricos à bateria para caminhões leves/médios que percorrem curtas distâncias e motores movidos a biodiesel, gás ou hidrogênio de baixa emissão para caminhões mais pesados.
Diante desse cenário, políticas públicas direcionadas à renovação da frota e à promoção de tecnologias mais limpas são essenciais para mitigar os impactos ambientais do setor de transporte.
“Este é um passo crucial em direção a uma mobilidade sustentável e inovadora para o Brasil. Estamos empenhados em impulsionar a transição para tecnologias de baixo carbono, protegendo o meio ambiente e fomentando o emprego e a renda”, destaca Aroaldo Oliveira da Silva, Presidente da IndustriALL-Brasil e membro do Conselho do MBCB.
Métrica da descarbonização
O debate em torno da descarbonização do transporte no Brasil passa por uma discussão complexa sobre as etapas do ciclo de vida dos veículos consideradas na apuração das emissões de carbono.
A metodologia atualmente adotada no Brasil, denominada do “poço à roda”, considera as emissões de CO2 na produção dos combustíveis e no uso do veículo nas ruas.
A literatura internacional especializada recomenda a medida de emissões no ciclo de vida completo dos veículos compreendendo, além do seu uso, todas as etapas de produção e de suas partes e peças, incluindo as etapas de extração e beneficiamento de minérios; a produção dos combustíveis e o descarte apropriado dos veículos e baterias, resultando em uma medida chamada do “berço ao túmulo”, a qual está prevista para ser utilizada no Brasil a partir de 2027 conforme preconiza o programa Mover.
O estudo traz em suas simulações, além das medidas do “poço à roda”, medidas de emissão com base no ciclo do “berço à roda”, incorporando as etapas de produção, conforme figura abaixo.
Fonte: UNICA com edição LCA Consultores
Sob esta última perspectiva, mais ampla, os veículos híbridos surgem como uma solução ambientalmente favorável, especialmente se alimentados exclusivamente com etanol.
Além disso, uma das simulações do estudo mostra que o aumento progressivo do fator de uso de biocombustíveis em substituição aos fósseis em cerca de 26 pontos percentuais (de cerca de 38% para 64% de 2030 a 2050) poderia equiparar as emissões globais de carros híbridos com veículos 100% elétricos, mesmo considerando a medição atual e mais restrita do poço à roda.
Estes resultados indicam o potencial de descarbonização dos biocombustíveis, soluções já disponíveis no país, de uma forma mais rápida e de baixo custo, uma vez que ocorreria mesmo sem mudanças relevantes na composição da frota atual de veículos – cuja renovação leva muito tempo, ainda em países como o Brasil, com baixo poder aquisitivo de parcela expressiva da população motorizada.
Neoindustrialização e geração de emprego e renda
Apesar dos desafios, o Brasil possui vantagens competitivas extraordinárias para a descarbonização do transporte, uma vez que suas matrizes energética e elétrica são limpas e compostas por energia renovável.
Além disso, o país já desenvolve, há décadas, alternativas efetivas de descarbonização veicular por meio dos biocombustíveis, destacadamente o etanol.
“O Brasil tem vocação para ocupar a vanguarda da descarbonização mundial, algo que já vem acontecendo desde a década de 1970 com a criação do Proálcool (Programa Nacional do Álcool). Para continuar nessa trilha basta combinar esforços e investimentos em tecnologia, produção própria e capacitação de pessoas, garantindo empregos e gerando renda”, afirma Evandro Gussi, CEO e presidente da UNICA e membro do Conselho do MBCB.
Ao combinar o conhecimento em biocombustíveis com avanços na eletrificação e uso de hidrogênio, o Brasil se destaca como um centro global no desenvolvimento de tecnologias de baixo carbono.
“O país é hoje um dos maiores protagonistas globais da mobilidade sustentável, por conta do uso de biocombustíveis como etanol, biodiesel e biometano. A combinação de biocombustíveis com eletrificação amplia o resultado de descarbonização e serve como referência para outros países que buscam soluções de baixo carbono”, finaliza Roberto Braun, diretor de relações públicas e comunicação corporativa da Toyota e membro do conselho do MBCB.
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