“Dinossauros estão gritando”: BYD ataca marcas tradicionais após carta a Lula
Em resposta à carta enviada por GM, Toyota, Volkswagen e Stellantis ao governo federal, fabricante chinesa critica resistência à inovação
César Tizo - julho 30, 2025
A BYD divulgou nesta quarta-feira (30) um comunicado em resposta à carta assinada por GM, Toyota, Volkswagen e Stellantis, que foi enviada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva pedindo que o governo barre a concessão de incentivos fiscais a veículos montados no Brasil sob regime CKD (completamente desmontado) ou SKD (parcialmente desmontado).
No texto, a montadora chinesa critica duramente a postura das concorrentes, acusando as empresas de agirem para manter um modelo industrial ultrapassado e prejudicial ao consumidor brasileiro. A carta das montadoras brasileiras, revelada nesta semana, alega que a eventual concessão dos benefícios representa concorrência desleal, ao permitir a importação de kits veiculares com alíquotas reduzidas.
A BYD, por sua vez, afirma que sua operação segue regras já utilizadas por outras marcas, inclusive com previsão contratual junto ao governo da Bahia para a montagem inicial dos veículos enquanto finaliza sua fábrica em Camaçari (BA). “Nada foi alterado. Tudo dentro do planejamento desde o começo”, afirma o comunicado da empresa.
A montadora também rebate o argumento de concorrência desleal, citando que oferece produtos com maior tecnologia por preços mais acessíveis, o que estaria pressionando outras marcas a reduzirem os valores cobrados por seus veículos elétricos. A BYD menciona inclusive uma redução de mais de R$ 100 mil em um modelo elétrico rival após sua entrada no mercado nacional.
Além disso, a marca defende que veículos montados localmente, mesmo que parcialmente, com geração de empregos e movimentação da cadeia logística, não devem ser tributados da mesma forma que carros completamente importados. A empresa ressalta que a medida que pleiteia é temporária e visa acelerar a transição para veículos mais limpos e modernos.
A reação da BYD ocorre em um momento de tensão crescente entre os novos entrantes no mercado brasileiro e as fabricantes já consolidadas. O debate em torno dos incentivos fiscais será decisivo para o modelo de industrialização a ser adotado no país nos próximos anos.
Veja a seguir o comunicado da BYD na íntegra:
Dizem que o futuro chega de repente. Mas, às vezes, o que chega de repente é o e-mail. O da vez foi uma carta enviada por quatro das maiores montadoras brasileiras ao Presidente da República, implorando para ele abortar a inovação. É isso mesmo: pedem, com todas as letras, que o governo impeça a redução temporária dos impostos para quem ousa oferecer carros melhores por um preço mais justo.
Assinada por representantes da Toyota, Stellantis, Volkswagen e General Motors, a carta tem o tom dramático de quem acaba de ver um meteoro no céu. O problema não é o meteoro, claro. O problema é que ele está sendo bem recebido pelos consumidores — aqueles mesmos que, por décadas, foram obrigados a pagar caro por tecnologia velha e design preguiçoso.
Agora, chega uma empresa chinesa que acelera fábrica, baixa preço e coloca carro elétrico na garagem da classe média, e os dinossauros surtam. Não foi por acaso que uma concorrente reduziu o valor de um modelo elétrico em mais de 100 mil reais depois da chegada da BYD. Por que antes custava tanto?
A carta fala em “concorrência desleal”. Porque nada é mais desleal do que alguém jogar o jogo — e ganhar. Nada mais injusto do que montar um carro no Brasil sob o regime autorizado pelo governo, com data marcada para nacionalizar a produção, e ainda assim entregar um produto que as “locais” não conseguem nem sonhar em oferecer.
A reação da Anfavea e seus associados, infelizmente, não é novidade. Trata-se do velho roteiro de sempre: diante de qualquer sinal de abertura de mercado ou inovação, surgem as ameaças de demissões em massa, fechamento de fábricas e o fim do mundo como conhecemos. É uma espécie de chantagem emocional com verniz corporativo, repetida há décadas pelos barões da indústria para proteger um modelo de negócio que deixou o consumidor brasileiro como último da fila da modernidade.
A ironia é que enquanto as cartas se empilham em Brasília, os consumidores já tomaram sua decisão. Basta olhar os comentários nas redes sociais da própria Anfavea: “Lutar por carro mais barato vocês não lutam, agora querem nosso apoio pra que?”. Ou ainda: “Sempre vou dizer o seguinte: se a Anfavea está tão incomodada, é porque o outro lado vale a pena”. Os brasileiros querem andar para frente e não seguir em marcha a ré.
A redução temporária de imposto que a BYD pleiteia segue uma lógica simples e razoável: não faz sentido aplicar o mesmo nível de tributação sobre veículos 100% prontos trazidos do exterior e sobre veículos que são montados no Brasil, com geração de empregos locais, movimentação da cadeia logística e pagamento de encargos. Isso não é nenhuma novidade, outras montadoras já adotaram a mesma prática antes de ter a produção completa local. E a BYD está fazendo isso.
Em menos de um ano e meio, já está finalizando a primeira etapa das obras da fábrica em Camaçari (BA), no mesmo local onde outra montadora, que também era tradicional, desistiu do Brasil. Apenas o galpão de montagem final já é mais do que a metade do tamanho da antiga fábrica inteira. E o contrato com o Governo da Bahia já previa essa fase inicial de montagem enquanto o restante da estrutura é finalizado. Nada foi alterado. Tudo dentro do planejamento desde o começo.
O incômodo das concorrentes não tem a ver com impostos, nem com montagem, nem com empregos. Tem a ver com a perda de protagonismo. Com o fato de que um novo player chegou oferecendo mais e cobrando menos. Com o fato de que a tecnologia finalmente deixou de ser um luxo para poucos e virou realidade para muitos.
O que a BYD propõe ao Brasil não é um atalho nem uma esperteza fiscal. É uma visão de futuro com veículos mais limpos, mais seguros, mais conectados e com custo-benefício justo. Ajudar o Brasil a acelerar essa transição é um movimento estratégico não só para a marca, mas para o país.
O Presidente deveria ouvir essas cartas — e usá-las como prova de que está no caminho certo. Porque se os dinossauros estão gritando, é sinal de que o meteoro está funcionando.