Brasil tem veículos com menor pegada de carbono do mundo, revela estudo
Matriz renovável e biocombustíveis colocam país na vanguarda da descarbonização; confira detalhes da pesquisa
César Tizo - novembro 6, 2025
Um estudo inédito da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) em parceria com o BCG (Boston Consulting Group) revela que os veículos brasileiros têm a menor pegada de carbono do mundo quando avaliado o ciclo de vida completo de automóveis, caminhões e ônibus.
A pesquisa, intitulada “Caminhos da Descarbonização: a pegada de carbono no ciclo de vida do veículo“, calculou pela primeira vez as emissões de CO₂ desde a extração de matérias-primas até o descarte, comparando veículos produzidos no Brasil com equivalentes da União Europeia, Estados Unidos e China.
Etanol brasileiro rivaliza com elétricos
Os resultados surpreendem ao mostrar que os veículos fabricados no Brasil que utilizam etanol – sejam híbridos ou a combustão – apresentam taxas de emissões comparáveis apenas aos modelos 100% elétricos produzidos no país com baterias ocidentais. Mais impressionante ainda: os carros brasileiros a etanol emitem menos CO₂ que veículos elétricos chineses ao longo de todo o ciclo de vida.
“Combustíveis renováveis são eficazes para uma estratégia imediata de descarbonização. A eletrificação ainda está em processo de aceleração, mas o Brasil já conta com uma significativa parte de sua frota beneficiando-se do uso de biocombustíveis, o que aparece de forma clara no resultado do estudo“, destacou Igor Calvet, presidente da Anfavea.
Matriz energética: o trunfo brasileiro
A vantagem brasileira se sustenta em dois pilares fundamentais. O primeiro é a matriz elétrica nacional, composta por 90% de fontes renováveis – hidrelétricas, eólica, solar e biomassa. O segundo é a matriz energética 50% renovável, beneficiada pelo uso em larga escala dos biocombustíveis, reflexo da presença expressiva de veículos flex na frota nacional.
Esses fatores impactam toda a cadeia produtiva, desde a fabricação dos veículos até a emissão durante o uso e a recarga de modelos elétricos. O estudo utilizou o conceito “do berço ao túmulo”, considerando a pegada de carbono desde a extração das matérias-primas, passando pela produção dos insumos, montagem dos veículos e distribuição, até chegar ao uso e descarte – a forma mais completa de aferir emissões de gases do efeito estufa.
Atualmente, os veículos movidos a combustível fóssil utilizados na China apresentam a maior pegada de carbono entre todos os tipos de veículos analisados. Os dados evidenciam os motores flex como um diferencial global da frota brasileira, posicionando o país como líder quando se trata das frotas mais limpas do planeta.
Onde se emite mais CO₂?
A pesquisa também identificou em que momento do ciclo de vida mais se emite CO₂. Os automóveis a combustão apresentam entre 87% e 91% de suas emissões durante o uso. Nos veículos eletrificados, essa taxa cai para 53% a 57%, sendo que a produção, especialmente das baterias, representa quase metade das emissões.
No caso dos caminhões e ônibus a diesel, mais de 94% das emissões ocorrem durante a utilização, fazendo com que quase todo o potencial de descarbonização dependa do maior uso de biocombustíveis. Para caminhões urbanos elétricos rodando no Brasil, as emissões no uso caem para 33%, ante mais de 70% nos outros mercados, devido à matriz limpa nacional. Ônibus elétricos também emitem mais na fase de produção dos insumos, sobretudo da bateria.
Biocombustíveis: solução para médio prazo
Os biocombustíveis destacam-se como ferramenta para promover a descarbonização no médio prazo, especialmente para caminhões rodoviários, onde a eletrificação ainda é restrita a modelos de curta distância. O Brasil encontra-se, portanto, em posição única para liderar a descarbonização em sua frota, mas também para exportar sua tecnologia flex e know-how em bioenergia para o mundo.
“O Brasil já parte de uma pegada de carbono menor, sustentada por uma matriz elétrica renovável e décadas de experiência no uso de biocombustíveis e frota flex. O estudo qualifica este ponto de partida e mostra o potencial de redução futura ao avançar em ganhos de eficiência ao longo das diferentes etapas da cadeia produtiva e de uso“, explica Masao Ukon, diretor executivo e sócio-sênior do BCG.
Caminhos futuros da descarbonização
Para os veículos a combustão ou híbridos, o maior potencial de redução na pegada de carbono vem da qualidade e do maior uso dos biocombustíveis, seguido pelo ganho de eficiência da motorização. Já para os elétricos, o corte de emissão de CO₂ depende de três fatores: uso de energia de fontes renováveis, baterias mais limpas e ganho de eficiência nas baterias (menores, com maior autonomia e durabilidade).
A vantagem que o Brasil tem hoje em sua matriz elétrica tende a ser reduzida nos próximos anos, dados os investimentos de outros países, sobretudo China e Europa, na redução do uso de energia térmica e aumento de fontes hídricas, solar, eólica e até nuclear. Já a matriz energética é uma vantagem brasileira difícil de ser superada, em função das condições que favorecem o cultivo e a tecnologia para produção de biocombustíveis.
Responsabilidade de toda a cadeia
Para o presidente da Anfavea, o novo estudo deixa claro que a descarbonização depende da cadeia completa. “Os fabricantes vêm se esforçando há muitos anos para reduzir a pegada de carbono, tanto nos processos industriais como na eficiência dos veículos. Essa mobilização deve ser estendida para toda a produção dos insumos, o chamado ‘berço’, e também para as operações de descarte e reciclagem, que têm grande potencial de descarbonização ao estimular a renovação de frota e o aproveitamento de materiais reciclados“, destaca Igor Calvet.
O Programa Mover prevê o cálculo da pegada de carbono no ciclo de vida como critério a partir de 2027 para a concessão de incentivos visando a descarbonização da frota brasileira. “O conjunto desses achados será a grande contribuição da Anfavea para as discussões sobre a descarbonização do setor automotivo durante a COP30, em Belém“, conclui Calvet.
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